Escritas automáticas feitas a cada 4h, por 10 minutos, durante a deriva.
Mapas feitos em datas diversas após a deriva.
O som do sapato de quem passa por mim
O som do sapato de quem está atrás de mim.
Terra incerta que vai brotando.
A gente anda e ela aparece.
Primeira Parada – 23h46
A cidade que conheço está ali
como um jogo agora com mais jogadores que pulam de um ponto a outro
A deriva começa tocando aquilo
que colocamos no espaço
Peças encaixáveis ou não
encaixáveis
Árvore de natal e joão bobo
Chafariz
Água suja
O que essas peças tem em comum?
Sigo
Caio no Bexiga
Se houve
a deriva
começa
E não entramos no bar aquele bar
sendo apresentado
Famílias andam comem gente anda e
come no meio da rua parece um baile
de cima da ponte o ponto vermelho
o ponto branco estamos na ponte para ouvir
A primeira ponte eu ouço como um
mar vazio a segunda é festa duas pontes em menos de duas horas sempre passos
atrás, o tilintar dos sapatos
Os passos de quem vem atrás são
bons porque dão a sensação de abraço
A lua começa pra deriva
Como se pode ver a lua com tantos
prédios?
O paraíso é engraçado
Lugar que vê coisa grande
Durante
Natal com lâmpadas frias. Esse azulzinho irritante.
Corpos e mega-empreendimentos.
Meu tamanho na cidade.
Espera dar o próximo passo para ver mudar o outro.
A rua é grande. Vai todo mundo junto.
A cidade te prende.
É bom subir o morro.
Segunda Parada – 5h55
Risadas no final são o sinal de
quem está com sono e cansada. O que é andar à exaustão? O que é ficar sem
dormir para viver a cidade?
O medo do viaduto foi real, a
inconformação foi real. Onde busco segurança?
Muitos ambientes conhecidos
colocados com outras cores.
Assim o vento do metro fez surgir
a risada. A exaustão, a loucura. Mas a loucura como outro estado. Fazer surgir
o fluxo. Então o muro vira dança. Então estar ali adquire um significado. E estar na
cidade a essa hora faz com que novas camadas no meu corpo fiquem clara. Quem é
que guia? Quem me guia? Quem nos guia? Essa pessoa de fato atrás da escolha.
Escolhe e faz surgir camadas também na cidade. Camadas da cidade, seus
discursos ficam nítidos e ela te puxa. O centro está na gente. A cidade cria
centros de força que nos atraem. Os centros estão na gente. Provocam a atração.
Mecanismo único. É isso que se faz se o corpo cidade tem outra relação. Corpos
cidades é plural. Qual o meu corpo cidade? Corpografia. O discurso do cheio e
do vazio. Exaustão é dimensão pela revitalização. Olhei o tempo. fim.
Durante
As principais pessoas
Os animais
Os muros
O chão
Situações
Dois cozinheiros
Dois africanos vendendo bijuterias
Um casal
Duas jovens de chinelos
Dois amigos que vieram do nordeste
Três artesãos
Muita gente numa festa
Um gato malhado
Um gato persa
Um cão que cruzou a rua latindo
Outro do portão
Um homem na ilha ri
Outro olhando pra cima
O que é cada um?
Presos pelo paraíso
Buraco quântico
Labirinto
Saímos
Aqui o cão é solto!
Terceira Parada – 11h48
Por onde começar a ficcionalizar?
A exaustão leva à criação de outros mundos e de camadas mais internas. O que
levar a deriva regada de torpor? Um cachorro me fez ter relação. Quem eu sigo e
por que não sigo? Por que estou na cidade e o que eu toco? Tocar as pessoas que
estão comigo. Sentir a cidade chamar. Necessidade do outro pra além do espaço, relações transpostas. Transbordantes. O desenho do paraíso nos faz ficar nele.
As pessoas da rua e fora dela me fazem me desinteressar do ambiente. Eu quero
sair. Como faço? O que sigo? Como sigo? Está faltando urbanidade aqui. Os
animas estão soltos e me levam. Quando cheguei e cruzei a ponte, vi o cão e
anotei. Encontrei. conversei. Segui. Esperei. Relação. Como fazer pequenas narrativas
da deriva. Estamos muito cansados, os corpos não agüentam mais e os espíritos?
Uma última sobrevida veio porque deixei a cidade entrar com ritmos diferentes.
Andei rápido para sair do labirinto. Pousei, movi pouco e senti o corpo por
dentro. Emoção de estar deitada nessa rua. Por que estou aqui? Eu tenho uma
casa. Minha pele. Porque quero os outros e eu mesma. Minha pele. Os que estão comigo me seguem mesmo. Estou viajando? Tocá-los antes ou depois ou durante a
cidade. Como nos afetamos na deriva? Corri. Há que entrar num jogo.
Durante
Morri várias vezes.
Hideo Kushiyama
Perigo! não pare na pista,
continue e continue, esgotamento físico, aos poucos o perde-se vai ficando
desesperador, as ao mesmo tempo é esse lugar que me move a ir.
A força do rouxinol urbano, o
passarinho que canta entre as pedras, entre as placas,
entre o concreto. Rouxinol
cantando na noite? ou a noite cantando o rouxinol, cantar os cantos, de canto
rua, de canto beco, de canto banco, de canto ferro, de canto flores.
De placa, des-vende-se
Vende-se desvende-se
Frestas, linhas, SI-dade
Entre na rua, mãos sujas de
parede, tocar a cidade deixa as mãos limpas, mais espaço,
mais poeira.
Experiência se tornou uma linda
palavra, desejo de tatua-la no corpo, ou alguma palavra que defina isso, desejo
de ter a cidade no corpo.
Corpo-
mapa-
desvio-
errante.
Nunca errar foi tão motivador.
O bando de pessoas que toca
movimento rua.
A rua entrando pelas veias
abertas do corpo EXPOSTO. Ex-posto de vicios, de costumes, de regras, de
padrão, de movimento, veias abertas da grande são paulo, a gente escorrendo,
tocando as veias dela, ou ela só tocando a gente.
As veias, vias, ruas, concreto,
chão tocam.
Terceira Parada 12h (Trajeto 8-12h)
A falta de sentido das coisas dá
sentido perdido. dá sentido perdido, tá se sentindo perdido?
Ouvir o som das ruas em meio a
tantos sons, se guiar por alguma coisa, paralelepípedos, que reagem, meu passo
reage.
Não saber onde estou, caminhar
sem mochilas é o estado de liberdade.
Passos, silêncios, espaço de
dentro, de fora.
Homem placa, sentir o chão,
pessoas na, em algum lugar que não sei descrever o nome.
O não saber do lugar.
Fico me perguntando aonde estou?
Talvez muito perto ou muito
longe?
Mas muito perto ou muito longe de
onde?
A lua tem algum som?
A calçada alguma escrita?
O silêncio sabor?
Escuta, concretude, infinito,
invisível?
O caminh. . .
Karen Santos
Primeira Parada – 0h (Trajeto das 20-24h)
Atraso, atraso, atraso.
Eu atraso.
Eu tento.
Eu atraso.
Eu mudo, não mudo.
Telefonema.
Mensagem.
Desorganização.
Correria.
Desespero.
Medo.
Créditos e bateria no fim.
O que estava em movimento não ia
parar.
Eu parava.
Informação.
Tentativa.
Perdida, perdida, perdida.
Encontrei a bermuda da Paloma
brilhando no escuro.
Saio da minha Deriva Isolada.
Acho a Deriva 24h.
Alívio.
Riso.
Consegui achar!
Impossível acontecendo.
Grupo.
O seguro não seguro.
Onde eu estou?
Aonde vamos?
Lugares familiares apareceram,
mas lugares não familiares provocam medo,
descontrole, arrepios, crises de
riso, desconforto, vontade de voltar pra casa sem saber
voltar
Perdida.
Vi pessoas estranhas e me
assustei. O que elas poderiam fazer? Onde essa rua vai
parar?
Impotência.
Curiosidade.
O que estamos fazendo?
Por que nos propomos a isso?
Falta de adrenalina na vida? Queríamos sentir adrenalina? Sentir o perigo? Mas
já não sentimos o perigo em outras situações? Por
que se colocar em risco? Por que
aumentar o risco? Parecemos aquelas pessoas que
vivem num mundo particular
“perfeito” e, por isso, sem graça, e que precisam passar
por experiências que deixem suas
vidas mais interessantes.
As câmeras nos protegiam.
Achei que quereriam roubar as
câmeras nas ruas, mas elas acabaram gostando e pedindo para serem filmadas.
Primeira Parada – 0h (Trajeto das 20-24h)
Natal, artigos natalinos para
todos os lados. A Paulista nesta época tem muitos artigos natalinos. A rua a noite me parece menos
silenciosa do que eu imaginava a priori, tem muitos sons de música, forró,
rock, funk, mais forró, mais forró. Estamos na Bela Vista, famoso bairro do
Bexiga, casas antigas, muitas pessoas nas calçadas, mesas, bares, luzes,
pisca-pisca, caminhamos e caminhamos sem fim, no Bexiga tem muitas bifurcações.
Perde-se com facilidade. Casa e churrasco, uma viela, final de rua
desconhecida, uma surpresa, crianças jogam futebol, amigos se encontram. Voltamos para a Paulista, Paraíso,
morros e mais morros, um sobe e desce ladeira sem fim. Uma rua tranquila, com
casas antigas, o tempo parou.
Silêncio. Não há ninguém. Azulejos nas paredes, materiais de construção, escadarias,
janelas, um gato persa olha e balança a cabeça. Ladeira novamente, chegamos ao
metrô Paraíso. Continuamos o caminho, luzes de natal, mirante da 23 de maio, pausa, apenas olhar. Praça, silêncio, a lua cheia nos
acompanhando. Na Praça Roosevelt,
no início da caminhada, estava garoando, céu nublado, achávamos até que iria chover. Agora o céu está limpo, poucas nuvens e a lua está
linda. Querer apenas pausar,
escorrer no chão, silêncio. Pessoas, muita vida na Paulista, carros, carro de
Boi, música, carro de Boi filmando a vida na cidade. Caminhar sem parar traz um
estado outro de corpo. Muitos faróis, luzes de natal, frio gelado. Com o passar
do tempo esquentou, ao caminhar e correr,
as casas antigas eram bem bonitas. Paramos para relaxar as pernas, perto
de um jardim de Natal, o segurança se incomodou porque corremos em uma praça
empresarial. Árvore seca, corpo
colapsado no chão em um lugar em silêncio. Liberdade de andar na cidade sem
medo, para onde quiser, em qualquer horário, subversão. Percepção do espaço urbano de outra
maneira. Escuta maior às micro-sonoridades e sensação de toque traz peso e
densidade para o corpo, em sua experiência. Entre lugares mais iluminados e mais escuros, vielas de
bairros, não tem ninguém. Segue o fluxo, muitas árvores. Um ateliê de objetos
de metal, ainda aberto, preparando uma encomenda de natal para um escritório de
advocacia, ele nos convidou a entrar, um espaço bem interessante. Ele está
vendendo o imóvel, a especulação imobiliária está em todos os lugares. Outra ladeira, vielas e casas, janelas,
crianças jogam.
Jantar – (0-2h)
Segunda Parada
- 6h (Trajeto das 2-6h)
Paulista, vento sopro que sai do
metro, ficamos um bom tempo por lá. Jogos e mais jogos de composição sendo
criados no instante. Composições instantâneas. Jogos com as estruturas existentes, muros, grades,
escadarias, bancos. Composições.
No muro de metal, esbarrões e choques, simultâneos, ou encadeados, um após o
outro, ritmos e sonoridades diferentes. Embate com a cidade. Correr de um canto a outro da rua e se
bater nas portas de metal das lojas. Conforme chega a madrugada o silêncio
também dá sinal de vida, um silêncio nem sempre fácil de conviver. A madrugada é um pouco sinistra,
solitária, sombria. Existe uma certa desolação, um silêncio incômodo, um
abandono. A cantoria na madrugada,
o rouxinol no banco de madeira. Um momento de quietude. Perder-se uma viela, pequena escadaria,
para onde estamos indo? Materiais de construção em uma caçamba, equilibrar-se e
desequilibrar-se... Ruas
silenciosas, correr, deitar-se, engatinhar nas ruas silenciosas, por vezes um
carro acelerado, o som se esvai volta o silêncio. Sinais de trânsito, acolher-se
no vazio da madrugada. Seguir por um caminho apenas para carros, incômodo, trajeto agressivo e solitário, não há
pedestres, só a lua. Silêncio. Obelisco, nós velando os mortos da Rev.
Constitucionalista de 32 e dando voltas no entorno do Ibirapuera, um caminho
sem fim, com o Obelisco sempre a vista.
Permanecemos um tempo na entrada do Mausoléu, o silêncio nos
possuía. Havia uma tensão no ar.
Escadas, muros, caminhada longa, cansaço, dor nas pernas, sono, dificuldade de
atenção. Uma feira de produtos
orgânicos, o dia estava nascendo.
Uma padaria aberta, pessoas a caminho de seus trabalhos. Seguimos para o Metrô
Paraíso, despedidas, seguimos. Só deixar o corpo pesar, no chão. Amanheceu,
estamos na Ana Rosa, em uma Ilha de carros, hora de tomar café da manhã para
seguir viagem. Estamos na metade de nossa jornada de 24h, os pés doem. Preciso de um café, o corpo pesa mais
ao perceber que amanheceu e não se dormiu. A quantidade de carros na rua
aumenta, o som dos motores, permanecemos parados na Ilha, ninguém se move, os
comércios abrindo as portas. Na madrugada só se ouvia os passos, uns dos
outros, silêncio absoluto no bairro, ocupar a rua. A noite não fez frio e a lua
cheia nos acompanhou a noite inteira. Estamos agora perto da Rua Estela.
Café da Manhã e pausa no Triângulo das Bermudas – (6-8h)
Terceira Parada 12h (Trajeto 8-12h)
Iniciou-se na Ilha Triângulo das
Bermudas, tivemos que dar uma micro pausa antes de começar a andar novamente.
Acredito que este momento do amanhecer seja o mais difícil, sabendo que ainda
temos a metade do caminho pela frente.
Finalizamos este trajeto seguindo um cachorro até a sua casa. A porta da
casa azul está fechada. Ele abriu o portão apenas, mas restou a porta de madeira
azul, permaneceu deitado olhando para a porta. A exaustão já se instaurava
nesta parte do trajeto, o corpo fica mais automático, responde com menos
qualidade. Escuto neste momento o cachorro batendo a porta, ele insiste. Neste trajeto ficamos por muito tempo
no bairro da Aclimação, muitas voltas. Passamos pelo parque da Aclimação e a
praça da caixa d´agua. Uma
maldição sem saída. Parecia um
labirinto, não havia como sair do bairro, permanecemos por longo tempo.
Pausamos em uma casa antiga, tocar, e depois em uma outra parte da rua, em
pequenas escadas na porta de comércios. Eu me aquietei também em um ponto de
táxi, um banco de madeira na sombra. O Sol estava bem quente, Sol a pino. Neste
momento eu me sentia uma velha de 100 anos ou mais, 200 anos talvez, que pausa
na soleira da porta e permanece sem nada fazer, apenas refletindo sobre a vida,
que passou, sobre as experiências vividas até então. O corpo responde pouco neste momento. Apenas contempla, vê a
cidade de outra forma. Não dá para
correr ou fazer movimentos abruptos, um corpo em falência. Viadutos, carros,
escada, uma casa com janelas, parede branca. Exaustão, faltam mais 6 horas.
Caminho lentamente e apenas permaneço nos lugares, como uma coisa, um objeto
jogado no chão. Alguém sem rumo,
sem história?, nem passado nem futuro. Um homem move-se estranhamente, uma
dupla de Testemunhas de Jeová nos aborda, cachorros, muitos cachorros presos a
cóleras levam seus donos para passear.
O cachorro que seguimos, não tinha colera, ele finalizou nossa trajetória
esta manhã. Abriu para a próxima jornada, o período da tarde, com o que nos
resta de corpo. Cansaço, sono, calor, a Cidade permanece no seu ritmo de vida,
os carros passam, as pessoas trabalham.
Com o cachorro, permanecemos, cochilando na sombra, preparo para a continuidade da jornada.
Ele se foi, a porta de madeira azul se abriu, e nós seguimos nosso caminho.
Ouço passos na rua, há de se continuar o trajeto, o derivar.
Almoço e
Pausa 12-14h
Ultima Parada
6h (Trajeto 14-18h) depoimento pós jornada...
Seguimos o fluxo, caminhada sem fim, sem pausa. Quase voltamos para o Bexiga, um
caminho bem semelhante ao caminho de ida, mas bifurcamos, e voltamos para a
Paulista. A entrada na Alameda
Lorena novamente foi também impressionante, com tantos caminhos que poderiam
ser vividos, a repetição era algo assustador naquele momento. Seguimos, bifurcação novamente,
seguimos para a Santos, Parque Trianon, uma sombra, depois de tanto Sol na
cara. Éramos retirantes naquele momento. Deitar no banco da Praça, não pode,
uma funcionária do parque nos proíbe. É impressionante a quantidade de
proibições para afastar moradores de rua para longe... Mata antiga, sombra gelada e
refrescante. Um respiro em meio ao fluxo da Cidade. Pisar na terra. Saímos do
Parque, fluxo novamente. Uma
cachoeira, o som da água era revitalizador. Em meio à seca de São Paulo, era um
conforto ouvir o som da água.
Fluxo, fluxo, fluxo. Rua
consolação pequena, consolação grande, Dr. Arnaldo, fluxo, fluxo, fluxo. Sol na cara. Dor na lombar, dor na perna esquerna. Corpo automático, segue o fluxo, pés tropeçam. A risada é um alívio, estar junto também é um alívio. Chegamos nas bancas das flores. Nesta
parte do trajeto estou como apoio, para atender o celular caso mais alguém
queira nos seguir e queira saber onde estamos, ou ainda para dar informações
caso alguém queira saber, mas sigo junto. Entramos no Cem. Do Araçá. Nos
perdemos, cada um seguiu uma alameda, e nos perdemos. Nos encontramos na rua do
Mausoléu da Polícia Militar. O cemitério
era um lugar bem simbólico para este momento da jornada, o silêncio, a falência
do corpo, o exaurir de forças.
Finalizamos então com uma conversa e decidimos seguir
andando em silêncio até a Praça
do Pacaembu, na frente do Estádio para fechar a ação com um Mapa coletivo
desenhado a giz sobre as experiências de toda a jornada de 24h. Uma ultima
surpresa, passeio de carrinho de golfe com o coveiro nas ruas do Cemitério. E
assim chegamos mais perto do Pacaembu,
saída pela parte de trás do Cemitério. A partir daí seguimos caminhando. E fizemos o Mapa coletivo
no chão!
Mapa Coletivo 18-19h (Pacaembu)
Paulina Caon
PRIMEIRA ESCRITA AUTOMÁTICA
(Meia-noite, em frente ao
Maksoud Plaza)
Finalmente um pouco de brisa (uma
pontada no estômago). Primeira grande pausa. Meus pés já dói muito, meu casaco
está fedido. Lembro: “No dia que eu vim me embora, minha mãe chorava em
ai, minha irmã chorava em ui... o qual não disse palavra...” . Metatarso
esquerdo, joanete esquerda, estômago à esquerda. Verônica passa em minha
cabeça; a sombra de alguém chama minha atenção. O que pode um corpo?... Flash
do medo na curva da aclimação, com o churrascão, alguém que fica pra trás. (“a
mala de couro que eu trazia, fedia, cheirava mal...” - continuo ouvindo a
música na voz de Pena Branca e Xavantinho). Um pouco de melancolia que não sei
se é também cansaço, saudades de não sei bem o que... Mais flashes de memória:
boca de Verot pintada de batom forte no casamento hoje; frases esparsas dos
passantes na rua enquanto caminhamos... Fico impressionada como podemos
conduzir o foco de nossa própria atenção para diferentes coisas, algumas tão
sutis (se deslocar ouvindo os sons, perseguindo os ares). Meu dedão lateja,
meus dedos também. Nada me passa na memória em relação ao caminho. O gelado de
um poste metálico de uma placa; o pé com meia branca pisando no cimento, eu de
ponta cabeça achando que ia cair... Consolação/Augusta, grade de fero, imagem e
textura da casca de árvore peluda, ladrilho branco, placa de metal no chão,
lisa, da TELESP (memória de que minha tia trabalhava na TELESP de Rio Claro),
meu pai, minha mãe, os Natais de antigamente em Rio Claro, os presépios da
avenida Paulista, a vontade de ser logo Natal, férias, amigos, pausa, descanso.
Meu pensamento divaga como meus pés, um silêncio me invade em certos pontos da
caminhada, como se eu pudesse nunca mais falar. Meu dedão esquerdo lateja. Na
verdade, na base dele, na parte alta do primeiro metatarso (por que preciso
explicar isso?). Parece que meu olho pisca mais lento, mais duro, o tênis
vermelho de Mônica me faz lembrar que não onde está o meu.....
SEGUNDA ESCRITA AUTOMÁTICA
(seis horas da manhã,
entroncamento da Paulista com Domingos de Moraes)
Frio nas costas pelo vento da
manhã – blusa fria batendo no suor que umedeceu a blusa. Cansaço. O que é
cuidar do outro, dos outros? O que é cuidar de si? Os olhos novamente pesam, a
cor do céu em certo horário próximo do amanhecer é igual ao azul líquido de
certo horário do início da noite. Sinto que vou dormir escrevendo. O grito da
mulher na bicicleta me assiste em meio à minha surpresa do quanto já amanheceu
nos últimos momentos da escrita (entre o olhar que mergulha no papel e o olhar
que volta a olhar o entorno). De repente parece já ser dia. Meus pés continuam
doendo. O sono atinge a escrita. Sinto que o cansaço não permite jogar os
procedimentos propostos porque as regras não estão tão claras. Pesquei de sono
enquanto escrevia. Levanto os olhos e vejo “AJINOMOTO” à minha frente, do
outro lado da rua, “especho mas cafemm” (???? dormi de novo). Fiquei preocupada
váras vezes na caminhada do “meopela” (???). Não consigo mais escrever, durmo
sempre no mesmo ponto de meu pensamento, não chego ao fim da frase ou do
pensamento.
Eu. Somos errantes, sou errante.
Somo heróis de uma era. Nossos corpos, meu corpo em transtorno físico, somos 1
coisa única pelo período em que a irmandade é inteira.
Sou ficção além do corpo, sou
lugar em meio às paredes. Me transformo! (me transformo, nos transformamos,
pois, não somos organismos mortos, somos um mesmo eu em impacto com o solo).
Solo que é só, solo que é terra, e que é dinâmica.
Somos vampiros, vivos,
organizados, experientes. Somos – sou – a flor que brota, ou melhor, que já vem
brotando das luzes da cidade. Desejo em ser um ser eterno. Somos eternos em
todos os lugares. Não penso – não pensamos – somos (sou) pensamento na rua, nua
e sem ar.
Somos (sou) a violência afetada,
atravessada pelo ar da noite, com o aroma do luar.
O que não interessa é a
lembrança, mas o corpo que seguimos criando, corpo de bando. Sujeira intacta.
Somos (sou) um corpo sem futuro,
sem estrutura, só derramamentos de prazer em ser. No calar da vaidade, meu
corpo – nosso corpo se esvazia de palavras, se preenche de so...
Rindo.
Eu aqui com letra informal...
O corpo ganhou...
Caneta falha.
Deriva em lugares ilusórios,
Medo, pensamento... rum,
Não pensar, resistir.
Dormir. Frio. Rua
Ser mestre, a...
-
Estado que foi criado partindo
das atualizações da experiência – sem representação.
O corpo torna-se um ser de
transtornos e afetos causados pelas insuficiências da natureza (do homem – do
universo).
Aquilo que disse que somos sem
qualquer menção original, ou melhor, que algum objeto designa, todos temos um
princípio na territorialização.
Minhas atuais, falam que não se
pode dormir.
Estado precário.
Ruas inatingíveis.
O que querem propor ao espaço,
não é proposta.
Sandra Ximenez
(segundo bloco de 4h)
Acompanhei somente o miolo
madrugada da deriva, estive entre 2 e 6 da manhã, mais ou menos, comecei com
eles na primeira mesa de comida e conversa, primeira parada, e segui até um
pouco antes, tipo 10 minutos da finalização desse bloco e outro intervalo.
passamos pelo metro paraíso e eu
fiquei lá. precisava ir mas não queria, estava claro que a coisa pedia uma
radicalidade e dava vontade de construir isso com os companheiros que estavam
fazendo a deriva toda.
a lua foi uma presença, com
astral de proteção mas
mas
a lua cheia sempre tb pode ser um
elemento perturbador, excitante,
desarmonizante, briguento.
pra mim restava uma desconfiança
com ela, uma paixão e ao mesmo tempo uma desconfiança sobre o que pode
acontecer numa noite de lua cheia,
seus perigos, e eu me colocando num lugar de cuidar tb, sabendo que eu estava
bem na hora da insegurança. Na madrugada de São Paulo, passando por lugares que
não se passa nessa hora. andando. ocupando.
o grupo se autoprotege um pouco.
o perigo pra um grupo como o nosso é surgir outro grupo. Não surgiu, só menor,
só pessoas em situação de trabalho, de um
trabalho suspeito, mas trabalho.
situação da mulher na cidade se
mostra clara. nos achavam um grupo feminino por mais que estivéssemos compostos
por 8 mulheres e dois homens. mexiam com as mulheres, convidavam.
sensação do Forrest Gump, quando
ele começa a correr e não para mais.
é bem
claro que poderíamos andar pra
sempre, parando, mas entrando sim numa situação de nomadismo provisório, um
provisório que poderiam ser anos, assim, no grupo, na cidade, em si mesma, nós
mesmos. assim, sempre andando, sempre provisórios, vivendo apenas
psicogeografias e necessidades básicas.
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